O uso abusivo de medicamentos controlados já supera o consumo somado de heroína, cocaína e ecstasy, segundo relatório apresentado este ano pelo Departamento Internacional de Controle de Narcóticos, órgão ligado à ONU. O psiquiatra Marcelo Niel, do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Unifesp (Proad), atribui o aumento da procura por medicamentos psicotrópicos ao estilo de vida da população. "Os problemas como estresse e ansiedade têm crescido cada vez mais e fazendo com que as pessoas busquem aplacar estes males", diz.
Outro problema comum que tem contribuído para o aumento do consumo de remédios controlados diz respeito à prescrição por médicos de áreas que não são as mais indicadas para receitar remédios psicotrópicos. Não é raro endocrinologistas, ginecologistas e até alguns pediatras receitarem calmantes, antidepressivos e remédios para emagrecer.
"Não é porque o especialista é de outra área que não pode receitar o remédio corretamente. Mas, há muito índices de erro por causa da falta de conhecimento prévio sobre os efeitos desse tipo de remédio", explica o especialista da Unifesp.
Quando as pessoas entram no consultório tentando achar soluções rápidas para as dores psicológicas que sentem, cabe ao médico saber a hora certa de medicar o paciente ou encaminhá-lo para um profissional mais qualificado no assunto.
O perigo pode estar no armário de casa
Mas não é só medicamentos com receita controlada que precisam de atenção especial. Os remédios simples que compramos na farmácia podem, em vez de ajudar, causar problemas para a saúde.
No Brasil, 80 milhões de pessoas têm o hábito de se automedicar, segundo levantamento da Associação Brasileira das Indústrias Farmacêuticas (Abifarma). "A automedicação vem de uma forte questão cultural. É difícil mudar isso. Todas as casas têm um monte de medicamentos e as pessoas cada vez mais pensam que sabem resolver seus problemas sem a ajuda do médico", afirma Rosany Bochner, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculada ao Ministério da Saúde.
O perigo da dependência
Um dos maiores problemas da automedicação é a dependência. Segundo a pesquisadora, tomar anti-inflamatórios toda vez que se tem dor nas costas, pode virar um vício, a ponto de o princípio ativo do remédio não fazer efeito no organismo, quando for realmente necessário. A mesma coisa acontece com frequência em relação aos descongestionantes nasais. "Os componentes dos medicamentos podem gerar um efeito rebote quase tão devastador como os de drogas ilícitas. Quando um medicamento é usado frequentemente, ainda que em pequenas quantidades, sofre uma diminuição progressiva do seu efeito. Ou seja, o indivíduo que antes melhorava com um comprimido, agora precisa de dois", explica a pesquisadora.
Além da dependência, outro problema decorrente da automedicação é o mascaramento dos sintomas e a demora em procurar o médico. "O atraso no diagnóstico pode ser sério e levar à morte. Os antitérmicos, por exemplo, se não forem usados com cautela, cortam a febre, mas a doença continua e pode se agravar se a pessoa não procurar um especialista", diz Rosany Bochner.
Não há exceções
Qualquer remédio traz consigo efeitos colaterais, que às vezes se manifestam prontamente ou às vezes demoram. Portanto, é necessário saber que o abuso de qualquer tipo de medicamento, mesmo que ela seja vendido sem receita é prejudicial.
Os antibióticos, por exemplo, quando usados de maneira incorreta podem inibir as bactérias do intestino, impedindo a absorção de nutrientes, ou, ainda, em casos mais graves, podem levar a diarreias crônicas, causando desidratação. Já o uso indiscriminado de anti-inflamatórios pode levar ao aumento da pressão arterial e a complicações nos rins e estômago.
Combinar medicamentos sem orientação médica, bem como alterar doses previamente estabelecidas podem ser altamente prejudiciais. "A interação medicamentosa é outro problema grave da automedicação. Muitas vezes a pessoa está tomando um remédio e decide usar outro por conta própria, o que pode gerar reação entre os componentes dos dois medicamentos, o que pode agravar o problema ou até gerar um novo", alerta a pesquisadora da Fiocruz. Um exemplo disso são alguns remédios para emagrecer, que quando combinados com antidepressivos provocam cardiopatia.
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